"PoLiTiCaMeNTe iNCoRReTa!!"

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

CoNSTeRNaÇão

    Reticente e farpado. Um silêncio cortante que prescruta surdo os gritos no cômodo vazio de um peito que se debate no oco de tanta querença. E é frio, não se dobra nem se rende ao olhar que sugou para dentro de si sem permissão, sem cerimonia, tal buraco negro engolindo galaxias distraídas. Agora, resvalo no amargo do rancor da vida que não sobreviveu à gestação, do tempo que não marcou o seu tempo dentro de mim, da água que não matou a sede e não se bebeu, do aroma que se perdeu sem que o sentido o provasse. Rancor do momento - sim, aquele da noite, com sóis e suspiros esparsos, com música de astro e o desenho da sua mão no vidro, embaço, - noite em que me atrevi entrar naquele breu, supondo estar lá, naqueles olhos de todo, de tudo que a vida nunca ofereceu. E desde então, eram seus olhos nas cortinas da manhã, nos faróis dos carros, eram olhos em tantas canções, eram olhos de paz e de uma pausa suave de sublimação. E te escrevi pra não me perder, pra te ter, te eternizar na minha história, poetizei você pra te encantar nos meus dias, como estrela que por todas as eras estaria lá e eu te cantei... Ah! Como eu te cantei, em tantos timbres e tons e em toda letra que ficou rabiscada nos cadernos de tecido. Encantamento... um pedido de estrela, dois dedos cruzados, olhos bem fechados, um papel de bombom e um nó - Feitiço de paixão! E como diz o poeta cantor de Alagoas - "Se errar por amor, Deus abençoa", perdão! Antes que eu me desse conta, era a sombra dobrando a esquina, como se nem alma tivesse. E cá dentro, o mundo implodindo em partituras e canções, milhões de notas despencando do céu de Dante, quase às portas do Paraíso, guiado pela mão de sua Beatriz. Desencanto então, desalento em forma de beijos que não dei, de olhos que pensei que olhei e achei que me achei, (não havia me achado, era miragem, olho de água do meu corpo deserto), e do corpo que eu não vou me perder, porque não há pensamento que te atraia. Já tentei telepatia, pensamento positivo, lei da atração! Não há frase que te toque, Pessoa me emprestou poemas, Rimboaud até me deu rima, Florbela sussurrou em português, mas mudos seus olhos nem leram, não me leram, não entenderam que eu só queria te arrebatar, e não há anzol que te fisgue, nem pedido que fique, porque não há espaço no teu regaço. E na raridade da vida, os risos não serão ouvidos, estarão represados, fora da dimensão tempo e espaço, onde vejo boiando, ali pertinho da lua platinada, nossas canções com refrões dissonantes, harmonizados entre sustenidos e bemóis, sem medo, sem reticência, sem abstinência. Cá, nesse plano ingrato, os dias não serão amanhecidos, nascerão apenas por rotina. As noites terão somente estrelas decepcionadas e nossas tardes serão iguais, sem lençol na grama, sem horizonte, sem pôr do sol, sem vento na cara e uma vida sem constelação, consternação.

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